
O incêndio criminoso de dois ônibus da São Jorge AutoBus, na madrugada de 21/5, ganhou contornos extras com o fato de a dupla incendiária deixar carta anônima acusando supressão de direitos e corrupção no Complexo Penitenciário de Ponte Nova/CPPN.
Esta FOLHA apurou com uma fonte, em 25/5, que uma primeira carta foi deixada na garagem da Viação Pássaro Verde, onde, em 13/5, houve incêndio de dois ônibus. A revelação da existência de duas cartas manuscritas (leia ambas abaixo) surge junto de sigilo com o qual trabalha a Polícia Civil.
Enquanto tramitavam em 24/5 as investigações sigilosas da Polícia Civil/PC, ocorreu importante reunião à tarde, no Fórum de Ponte Nova, com vistas à avaliação da gravidade do momento e à necessidade de ação conjugada das autoridades da área de segurança pública.

“Medidas estão sendo adotadas para que novos fatos dessa natureza não se repitam”, informou a esta FOLHA o juiz Felipe Alexandre Vieira, da Vara de Execuções Penais.
O magistrado recebeu no encontro fechado os promotores de Justiça Sérgio Moreira dos Santos e Cyntia Campos Giro e representantes das forças policiais: pela PC, delegado regional, Carlos Roberto Souza da Silva; pela PM, capitão/subcomandante Thiago Guimarães; e pelo CPPN, diretor Márcio Pedro Alves.
“Estamos investigando o caso com rigor”, informou a este Jornal o delegado regional. Acrescentou o capitão Thiago: “Buscamos estratégias de combate à criminalidade diante de situações como esta. Não podemos passar detalhes porque a investigação é sigilosa, assim como os nossos entendimentos, os quais vão subsidiar ações futuras em respostas a este fato.”
O outro lado
“No interior da Penitenciária Ponte Nova não há, nesse momento, qualquer movimento de indisciplina que abale a segurança da unidade”, informou o juiz Felipe.

Diretor da Penitenciária, Márcio Alves enviou nota a este Jornal afirmando que a apuração do fato “já avança em boa direção”. Ele adianta, contudo, o seguinte: “A motivação nada tem a ver com as condições da nossa unidade, já que todos os direitos – e as normas de disciplina – são respeitados.”
O diretor do CPPN considera “leviana” a acusação e desabafa: “Trata-se de calúnia destinada a causar transtornos no bom trabalho realizado na unidade. Os responsáveis serão identificados e responderão na Justiça. Repudio a acusação, que se deu em virtude de prática criminosa com finalidade de tentar prejudicar profissional de conduta ilibada. Destaco que as transferências de detentos não são da alçada dos diretores, mas da Superintendência/MG de Gestão de Vagas.”
Entenda o caso
Na madrugada de 21/5, dois homens (identidades investigadas) incendiaram dois ônibus na garagem da São Jorge AutoBus, no bairro Triângulo Novo. Antes de fugir, eles deixaram carta com um motorista para ser entregue à Polícia. Tudo ficou gravado pelas câmeras de segurança da empresa e de área vizinha.
Pessoal do Corpo de Bombeiros/CB atuou – sob comando do sargento Vítor Lanna Felga – no combate às chamas.
À Polícia Militar, os dois motoristas, que pouco antes chegaram dirigindo os veículos usados no transporte de trabalhadores da empresa Saudali Alimentos, disseram o seguinte:
– Dois cidadãos entraram na garagem e pediram permissão para beber água. Já no escritório, um sacou uma arma e rendeu os motoristas, enquanto o outro jogou material inflamável num ônibus e ateou fogo.
Pela manhã, peritos da Polícia Civil vistoriaram o local.
O diretor da São Jorge Flavinho Andrade disse à nossa Reportagem que calcula o prejuízo de R$ 300 mil. Ele se absteve de outros comentários sobre o incêndio para preservar a investigação policial do atentado.
Em tempo – As duas cartas contêm o mesmo teor, porém as caligrafias são diferentes (uma com caneta vermelha e a outra com tinta preta) e a redação difere nas concordâncias e na pontuação. Outro detalhe: uma parece ser mais antiga (está com algumas partes rasgadas). Ambas seguem transcritas literalmente (sem nenhuma correção):
Íntegra de uma carta
“Recado!
Tal reivindicação está sendo realizada pela falta de direitos humanos no Presídio de Ponte Nova.
O diretor Marcos Pedro e sua coordenação, além de não terem respeito com os detentos e familiares, pedem suborno para ocorrerem uma transferência pedida.
Tanto ele quanto o diretor do Presídio de Ipaba possuem contato direto para o cumprimento de propina para os detidos não pagarem nenhum valor, enquanto a transferência para um presídio que tenha o mínimo que este não tem: televisão, rádio, atendimento essencial, deveres e dignidade.
E não vamos aceitar continuar nesta situação ou ir para Ipaba. Portanto a cidade de Ponte Nova irá pagar o preço da corrupção dessas ‘autoridades’. E se não resolverem, na próxima vez, serão queimadas as ambulâncias. O preso merece e precisa de respeito, dignidade humana.
Isso tudo que está acontecendo já foi avisado antes ao diretor Marcos Pedro. Se ele não tomou nenhuma atitude para solucionar, a culpa não é do detento.”

Íntegra da outra carta
“Reivindicação contra o diretor Marcos Pedro e sua coordenação da Penitenciária de Ponte Nova.
Tal reivindicação está sendo realizada pela falta de recursos e direitos humanos no Presídio de Ponte Nova.
O diretor Marcos Pedro e sua coordenação pedem suborno para a transferência dos detentos, porém os mesmos não irão pagar o valor pedido, pois é inadmissível uma autoridade cobrar para a ida a outros presídio.
Tanto Marcos Pedro quanto o diretor de Ipaba têm convênio de propina e, portanto, eles não aceita ir para esta cidade se tal situação não for solucionada.
Após as queimas dos ônibus, o próximo serão as ambulâncias, e a população de Ponte Nova irão pagar pelo crime desses senhores que não respeita as próprias leis.
Os presos pedem o mínimo que merecem: acesso a rádio, televisão e atendimento essenciais, como não foi fornecidos estes serviços, a transferência terá que ser realizada.
E como destaque, Marcos já sabia que isso iria acontecer, entretanto se não resolveu o que foi preciso a culpa não é de quem pede a reivindicação.
O desmerecimento e descaso que o Presídio está tendo é considerada falta de dignidade humana.
Considerem uma ameaça ou um aviso.”