
Ainda que previsse visitar a loja, estar do lado de cá junto à clientela que enche o ambiente, apreciar os novos produtos e abraçar minha ex-sócia me surpreende. O espaço é uma boa surpresa, não a do susto, mas do tipo admirável. Não me espanta o entusiasmo das clientes nem a animação da Fabiana, proprietária-produtora-vendedora-administradora-criativa-digital-influencer, que rápida faz selfie e posta pros seus mais de cem mil seguidores no Instagram com a legenda: “Fundou a papeletudo comigo visita vip”. O que me admira é o que sinto.
(Por todos os anos 1990, os cartões, camisetas, posters, porta-copos, calcinhas, cuecas etc. com frases francas, emocionantes e ousadas ultrapassaram Belo Horizonte e cruzaram o país).
Hoje, dentro – e fora – da Papel e Tudo, me pasma o tempo em suspenso. Pode ser pelo toque nas mesas de aço martelado ou pela humorada fala da Fá, as frases pioneiras – e outras novas – vão surgindo na minha cabeça. Quase passo um zap pro Fê (minha dupla de criação na época) fazer os leiautes. Saio da loja lembrando, sucessivamente, das pessoas cofundadoras dessa história: Jimmy rasgando o papel pra bolar a marca, Bernardo criando a cara dos primeiros cartões, Nícia compartilhando o estande em Sampa, Ângela fazendo contas, Taciana preenchendo notas, Edmar embalando caixas, Ferraresi cortando o dedo, Kátia gerenciando, Andréa dirigindo, Magda atendendo, Andréia vendendo, Cristiano representando, Fernando inventando… a ilustradora ruiva e o estagiário daltônico cujos nomes não me recordo… Sigo no corredor, apertando a mão de Isabella, certa de que a baleira Alcione me aguarda sorridente pra dizer que vendeu todos os postais do modelo CN01: “Você encanta, emociona, desorienta, me tenta”, nossa moedinha da sorte.

– “Aqueles móveis me deram um ataque de ternura (…) Bom viver na arte…”, brindamos.
O passado, como dizia minha mãe, corre atrás da gente. E é muito bom não correr dele. Encontrá-lo no presente, sem poeira pra espanar, sem lágrima para engolir. Admirá-lo à luz que chega dos cobogós. É uma paz deixar a lembrança se alegrar com tanta coisa boa pra não se esquecer…
Havia criado uma lista, datilografada, de frases provocativas e divertidamente apaixonadas. Num sábado, encontro espalhados na minha cama onze cartões coloridos. Em papel encorpado, cada um numa cor lisa, vazando em branco uma frase da minha lista. Fontes (que eu ainda chamava de letras) diferentes. Textos imagéticos. Imagens textuais. Letreiros lin-dos! “Disfarçar pra quê, se quando te vejo é a maior bandeira?!” num fundo óbvio verde nacional. “Hoje é um bom dia pra dizer que quando te vejo, perco o juízo, o rumo, a fala, o ônibus…” todo laranja.
Cada modelo dentro de um pacotinho com dez unidades, ao todo, portanto, cento e dez postais cabíveis na pasta de couro que saio vendendo de bar em bar, um a um, até Neísa da Casa de Papel, descolada papelaria de Juiz de Fora, pedir cem de cada tipo. Su-ces-so!
As lembranças vão atravessando meus pensamentos sem nostalgia. Muitos capítulos de boas recordações. Mesmo que a memória misture datas e acontecimentos, de fato, a alma grava. Hoje na Papel e Tudo a sensação é a mesma, porém diferente. Feito ver beija-flor na florada do ipê plantado por mim. Sintonia na leveza, breve visita e voo que segue. Alegria e honra.
Gracias e parabéns, Fabiana Antunes Rocha, você que persiste em marcar a vida com arte. Sua loja está linda!