O conteúdo desta matéria é exclusivo para os assinantes.

Convidamos você a assinar a FOLHA: assim, você terá acesso ilimitado ao site. E ainda pode receber as edições impressas semanais!

Já sou assinante!

― Publicidade ―

Ilustradora de nossa região presente na Bienal do Livro RJ 2025

Na Bienal do Livro, haverá lançamento da obra “Uma vida bordada em palavras”, ilustrada por Luísa Viveiros, artista radicada em Ponte Nova.
InícioCULTURALaene ComVida à divagação

Laene ComVida à divagação

 
Dona Pergunta vive de perguntar. Cada resposta é um gatilho pra mais arguição… Apaixonou-se muito cedo pela interrogação que nunca se cansa de seguir perguntando. Uma hora desconfia, noutra se angustia… Tudo é motivo pra indagar. Mas pra ela acreditar – que é bom e todo mundo gosta – na resposta, só mesmo em dia de segundo sol ou noite de boa lua. Não adianta responder mais longo ou apresentar novas provas. Pra Dona Pergunta há sempre indícios, pistas, cismas e haja tempo pra tanto interrogatório. 
 
Acredita que ela, até quando dorme, interroga? Nas palestras de que participa, chega quase no final, naquela hora do público (o quê?) perguntar. Seu lema é “pergunto, logo existo”.
 
Mas podia também ser “indago, logo desconfio”. A senhora indagadora duvida até do espelho, briga (!) com ele: que sorriso besta é esse que não estava aqui ontem? Se sai à rua, linda que é, suspende as sobrancelhas e o pescoço pra quem a olha mais demorado. Antes de abrir o presente que chega fora da data, dispara: o que você fez de errado, hem? Tanta perguntação parece que não tem cura. 
 
De pergunta em pergunta nenhuma resposta resolve. Mas, contudo, todavia, entretanto, para viver bem com a estimada dona indagação, descobri uma dica: pra cada pergunta, devolva um sorriso, um suspiro, um cheiro… Se ainda assim ela não se contentar, manda uma pergunta de volta só pra variar…
 
Vizinha da Dona Pergunta, tem a Madama Exclamação! Tipo Pollyana pandêmica, ela nunca questiona, jamais desconfia e, muito raro, deprime com a situação. Para ela, sempre há jeito pra tudo e se a refutam: Há a morte, ela exalta o jogo do copo, exclamando: Viva a encarnação! Em qualquer chat ou fila de banco presencial, a exclamativa madama espalha a rodinha com seu brado retumbante, sua chegada triunfal. Ela não fala, declama! Se a árvore está perdendo as folhas: Calma, já chegam as flores. Para ela, a falta de luz é pra brincar de sombras. 
 
Madama exclamação é uma mistura de arco-íris com Elke Maravilha. Gosta de ouvir as pessoas sempre com a resposta pronta e um sorriso aberto – irritantes – para lamentos, dores, tristezas. Ela até hoje acha que la vie é rose mesmo quando chove há quatro dias! Se algo quebra é sorte! Se o carro não pega é proteção! Se nada acontece é porque ainda não é a hora! Quando a madama sai de carro, do nada, ela grita com a cabeça pra fora da janela: Iuhuuu! e gargalha. 
 
Para conviver com tanta vida exclamada e não sucumbir aos ataques de iupis e yes (!), retumbe na caixa de som Vander Lee… ou ecoe Vinícius por Bethânia no celular. Sei que a madama exclamativa vai suspirar em reticências… Mas se, em seguida, o respiro fundo se transformar em animado drama e a vida voltar a ficar por demais exclamada, esconda os Citaloprans e leia em voz alta as notícias do dia.
 
Apaixonado pelas duas, o ponto final tem se transgredido em reticências. Simplesmente porque não consegue pôr fim aos diálogos entre elas. E toma bronca da excelentíssima Gramática que já lhe avisou: mais uma e é rebaixado a ponto e vírgula, viu? Quem está gostando da transgressão é a reticências que suspendeu os trabalhos e já partiu de férias pra Porto Seguro. Deitada na rede, ela sorri e só. A única vez que abriu a boca foi para informar que está em voto de silêncio, orientada pela monja Cohen…
 
Não pense que acabou por aí. A história dos pontos/pessoas é cheia de pausas, interjeições, choramingos, suspiros, disputas e surpresas. Pessoas-vírgulas, sujeitos-dois pontos, indivíduos-aspas povoam nossas vidas. E ainda tem o povo da acentuação. Pergunte a um ser-grave o que representa na sua vida uma pessoa-circunflexa… aiai… é muita resenha pra narrar. Aí então, deixemos para a próxima. Porque hoje o dia é da Dona Pergunta e da Madama Exclamação. 
 
error: Conteúdo Protegido