Aos 75 anos, completados em 19/3, João Bosco Sousa revela que desde 1984 (*) não vai mais a um campo de futebol em Ponte Nova, por entender que “o nosso futebol acabou”. A avaliação não é de um torcedor qualquer, mas do lendário goleiro Toco, hoje dono de bar no bairro Triângulo.
No entender dele, a crise na Liga Municipal de Desportos, especialmente ao final da gestão de Angelino Cardoso, no final dos anos 1980, mais a falta de dedicação dos clubes, acabou com os grandes times.
‘Bola quadrada’
“Há alguns anos, Moura Cardoso, da Rádio Ponte Nova, me perguntou por que o grande futebol acabou em Ponte Nova, e eu dei mais uma dica: entra prefeito, sai prefeito, a Secretaria de Esportes tem à frente, com algumas exceções, gente que não sabe se a bola é redonda ou quadrada”, declara Toco.
Ele, que jogou no gol em todos os times de Ponte Nova, à exceção do EC Palmeirense (“certa vez me barraram numa festa lá, e então nunca aceitei convite para jogar no time”) e tem uma frustração: acha que poderia ter atuado como treinador de goleiros e não teve esta chance.
Ele não tem arrependimentos, mas acha que teria chegado a uma carreira nacional, se em 1964 tivesse atendido convite de dirigentes do Fluminense para fazer testes no tricolor carioca. O convite não veio por acaso: Toco “fechou” o gol no jogo em que o Flu (time-base da Seleção Brasileira) veio a Ponte Nova e venceu o Primeiro de Maio (que foi a campo com um time reforçado) somente por 2 x 1.
O fato é que ele ficou em Ponte Nova, casando-se com Auxiliadora Silva Sousa, com quem teve três filhos (e “curte” seus três netos), sendo conhecido pelo apelido: “Me chamaram de Toco desde menino, porque eu era ‘troncudo’”, revela ele, que aos 13 anos, em 1955, foi “tentar” a sorte no Municipal Atlético Clube/MAC, mas disse que jogava na ponta direita.
“Só que um amigo, Hélio Rosmaninho, falou para o Nonhô (apelido de Vitalino Gomes Filho, dirigente do MAC) que me viu ‘fechar o gol’ no campinho da Vila Oliveira. Tive que ir pro gol, peguei tudo e, já na estreia, ao invés de jogar no juvenil, já estava no gol do time principal”, revela Toco.
Toco começou a jogar bola no Cantinho do Céu (antiga região do bairro de Fátima), onde nasceu e morou com seus pais. Jogou ainda no time do Oratório Festivo de Padre Adolfo, no Colégio Salesiano Dom Helvécio.
Já as suas belas defesas com a camisa do MAC o levaram a aceitar convite para jogar, já com 16 anos, no Pontenovense Futebol Clube/PFC, num período em que se destacou também no time do Tiro de Guerra. Já em 1963, com 21 anos, vestiu a camisa da Sociedade Esportiva Primeiro de Maio/SEPM e ali fez história como atleta completo até o final de 1972.
Neste meio tempo, ele teve experiências diversas. Ocorre que, sendo vigilante bancário (na Caixa Econômica Federal e no Banco do Brasil), em certa época foi transferido para Ouro Preto e, por um ano, acabou jogando no Aluminas, de Saramenha.
“Cheguei e fui fazer o teste, sabendo que o time já tinha dois ótimos goleiros. Foi só eu começar a jogar, e os dois passaram a ser os meus reservas”, lembra Toco, que não se vê como “jogador convencido”, mas sim como um obstinado goleiro que, estudando os atacantes, passou a “adivinhar” seus chutes.
Dois exemplos lembrados pelo antigo craque:
– “Houve uma final do Primeiro de Maio contra o Pontenovense, onde o goleiro ‘deles’, Gérson, vindo do Vila Nova/Nova Lima, era craque. Na final de 3 jogos, 1 x 0 pra nós, 1 x 0 pra eles e, no tira-teima, 0 x 0. Fomos para os pênaltis, e eu, que ‘manjei’ bem o jeitão dos jogadores deles, defendi 4 dos 5 pênaltis.”
– “Fui jogar no gol do Ana Florência/Pião, em Abre Campo, e o placar era nosso (2 x 1), com muita ameaça da torcida. O juiz inventou um pênalti pra eles no final, nosso time ameaçou sair de campo e, pra acabar com o problema, Nelson Mendes, que era presidente do time do Pião, disse pra eu deixar a bola entrar e assim acabaria o jogo. Só que um rapaz me xingou, e eu peguei o pênalti. A partida continuou por mais 10min, e eles não empataram.”
‘Sou, realista’
Toco insiste em que não é convencido. “Sou realista e faço questão”, declara ele, sempre bem humorado, para lembrar que certa vez, no Bar de Chico Roberto, ao lado das Lojas Gomes, em Palmeiras, alguns rapazes faziam levantamento dos principais goleiros de Ponte Nova desde 1960.
“Eu entrei na discussão, dei o desconto para Cirilo, que era o goleirão do Primeiro de Maio até 1960, e, sem contar um ou outro goleiro do Palmeirense, onde não joguei, fui mostrando que todos os nomes do Primeiro de Maio, do Pontenovense e do Municipal foram meus reservas”, conta ele.
(*) – Em 1984, jogando no Estádio do Pau d’Alho, o Primeiro de Maio foi derrotado pelo Santacruzense, de Santa cruz do Escalvado, que sagrou-se campeão regional. O time de PN perdeu ali o torcedor Toco.