Para comemorar o Dia Nacional da História em Quadrinhos (30/1), o portal Pascoal On-Line/Raulsoares divulgou texto de Eliza Peixoto/jornal Estado de Minas com o raulsoarense de coração Nilson Azevedo, 68 anos, que teve importante papel na divulgação do quadrinho de Minas Gerais com seus personagens, publicados nos jornais Estado de Minas, Jornal do Brasil e O Pasquim, entre outros. Ele já conquistou diversos prêmios, como, por exemplo, o Primeiro Salão Carioca de Humor em 1988, com cartum homenageando seu grande amigo, o cartunista Henfil.
Minha personalidade é uma mistura de Jesus Cristo, Pernalonga e Che Guevara, assim se define Nilson Adelino Azevedo. Apesar de ter nascido em Belo Horizonte, em agosto de 1948, considera-se da cidade de Raul Soares, para onde se mudou com sua família, quando ainda era bebê.
Antes dos quatro anos, Nilson descobriu-se desenhando de maneira inusitada. Quando o pai, Seu Adelino, chegava do trabalho na Prefeitura de Raul Soares, Nilson corria para seus braços para pegar o lápis que ele sempre trazia atrás da orelha. Logo arranjava um pedaço de papel e começava a desenhar. Valiam inclusive as paredes da casa, rabiscadas até onde sua altura permitia, informa o jornal de BH.
Ele relembra a importância dos quadrinhos para a geração dos anos 50 no Brasil. Naquela época, os quadrinhos dominavam as bancas de revistas, porém, como sua família era pobre, Nilson nunca tinha dinheiro para comprar os gibis. Mas lia os quadrinhos emprestados dos amigos. Quando podia comprar uma revista, depois de ler, sempre era obrigado a trocar pelas novas edições, assim nunca conseguia ter uma coleção inteira.
Naquela época, os gibis não eram proibidos, mas eram mal vistos pela Igreja e as famílias tradicionais. Ele conta que eram comuns frases como para com isso menino, aposto que aprendeu isso nessas porcarias de gibi. Era muito comum também as mães queimarem os gibis quando as crianças eram reprovadas no colégio. Ele conta que seu dom não lhe facilitou a vida no Colégio Regina Pacis, dirigido pelo padre Sérgio. Todo 21 de Abril, tinha de desenhar o Tiradentes no quadro e personagens em outras datas históricas. E tudo que era desenho de sacanagem que o padre pegava, eu logo levava a culpa. Depois o padre Sérgio virou personagem em minhas histórias, conta o cartunista ao EM.
Em 1963, aos 14 anos, vem a Belo Horizonte pela primeira vez visitar a irmã, Neidinha, que namorava um irmão do Ziraldo/conhecido ilustrador da época: De repente me vi na casa do Ziraldo. Não sabia para onde olhava, se pra ele ou para o aparelho de TV, que estava ligado, uma novidade para mim.
Depois de ver seus trabalhos, Ziraldo o convidou para ser seu assistente no Rio de Janeiro: Eu fiquei assustado: cristão, virgem, sem sair de Raul Soares, o que vou fazer no Rio, eu vou ficar louco por lá! Não fui e criei duas histórias do Pererê e mandei para o Ziraldo. Uma delas foi publicada por ele na última revista, que saiu em março de 1964. Ele colocou o meu nome e virei herói na cidade: Nilson saiu no Pererê!
Em 1965, minhas irmãs mais velhas que moravam em BH me sequestraram, para impedir que papai me mandasse para a Aeronáutica. Estudava no Colégio Estadual Central e trabalhava como boy na Mendes Júnior, relembra. Em 1969, ao passar no vestibular, foi trabalhar na agência de publicidade Dinâmica, onde aprendeu tudo de criação e gráfica.
Ao levar alguns trabalhos para o Jornal dos Esportes, no Espírito Santo, conheceu o jornalista Euro Arantes, do Jornal Binômio, o cartunista Henfil e os jornalistas Vander Pirolli, Bley Barbosa e Célius Áulicus. Tenho muito a agradecer a todos eles e ao Ziraldo, reconhece.
Ele conta que mostrou alguns quadrinhos para o jornalista André Carvalho, do Estado de Minas. Então ele tirou do jornal infantil Gurilândia a tira da Luluzinha e colocou o meu Neguinho do Pastoreio no lugar. O Negrinho estourou. Para fazer este personagem, ele se inspirou num garoto que andava a cavalo em pelo, em Raul Soares, e ele morria de inveja ao vê-lo passar, buscando o animal no pasto. Tudo que sou, que desenho, veio de Raul Soares. Apesar de nascido aqui, me considero de lá.
Em 74, vai para o Rio de Janeiro, onde ficou por oito meses, morando com o cartunista Nani. Foi uma época horrível, pois com a censura vetando tudo ninguém conseguia publicar nada e vários jornais fecharam. Voltei para BH e fui ilustrar livros de inglês e trabalhar no Jornal de Minas. Veio aí fase dos jornais, o De Fato, o Jornal dos Bairros, relembra.
De 79 a 84, morou em São Paulo, onde trabalhou com Henfil e presenciou de perto a truculência da ditadura. Volta para Belo Horizonte e a partir daí passa a ser vetado, assim como outros cartunistas na grande Imprensa. Em 2005, publica a tira Caravelas e o Negrinho do Pastoreio no Jornal do Brasil, a convite do Ziraldo.
Hoje é difícil sobreviver apenas da arte do cartum e do quadrinho na Imprensa. Antes havia o espaço de O Pasquim, Movimento, De Fato, mas hoje existe mais nenhum veículo de esquerda. Temos bons artistas, que não fazem mais porque não lhes é permitido, comenta Nilson. Ele inclusive menciona o caso recente do cartunista Duck, que foi processado por uma charge publicada no jornal O Tempo. Atualmente, ou melhor, há 25 anos, Nilson ilustra as publicações do Sindicato dos Eletricitários de Minas Gerais.